Podcast Economistas: Luiz Carlos Bresser-Pereira explica o novo desenvolvimentismo
Professor participou de debate no Cofecon e destacou a importância de elementos como câmbio depreciado, juros menores e a desvantagem de tentar crescer com poupança externa
O Conselho Federal de Economia realizou nesta terça-feira (13) um debate com o ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira. O tema foi “Novo desenvolvimentismo: introduzindo uma teoria econômica e economia política”, título do novo livro do professor, no qual ele aborda esta corrente de pensamento.
“Estou agradecido pela sua participação em mais uma iniciativa do Cofecon, e também porque já bebi muito desta fonte que são os seus escritos”, expressou o presidente do Cofecon, Paulo Dantas da Costa, ao finalizar o debate. “Agradeço pela sua presença e também por essa aula que nos deu”, completou a vice-presidente Flávia Vinhaes.
Para introduzir a teoria do novo desenvolvimentismo, Bresser repassou algumas escolas de pensamentos dominantes, como a mercantilista, a neoclássica, a keynesiana e a neoliberal, referindo-se a esta última como um desastre para os Estados Unidos e Europa e ainda maior para o Brasil e a América Latina e à keynesiana como muito boa, mais realista e viável, mas pensada para os países ricos e para o curto prazo. “Fui formado na teoria desenvolvimentista clássica, estruturalista, que é a de Celso Furtado e Raúl Prebisch. Ela foi muito efetiva em orientar o crescimento que o Brasil teve entre 1930 e 1970, quando realizou sua revolução industrial e capitalista e o país se desenvolveu enormemente. É uma teoria muito boa, mas também não é suficiente”, apontou Bresser.
Como não é suficiente, ele aponta para a necessidade de uma nova teoria, que se apoie na teoria keynesiana e na desenvolvimentista clássica. Surge, então, o novo desenvolvimentismo. “Uma forma de começar a falar sobre ele é que existe, na teoria econômica, uma ideia das condições gerais da acumulação de capital, e havendo acumulação com incorporação de progresso técnico, o país se desenvolva”, comentou Bresser. “Uma estratégia fundamental de desenvolvimento é conseguir aumentar a taxa de investimentos ou a taxa de acumulação de capital”.
Entre as condições microeconômicas, há a educação (“o mais importante, a meu ver”, mencionou o professor); um sistema constitucional e legal bem feito, que garanta a propriedade e os contratos; um Estado que garanta os investimentos em infraestrutura, porque é o Estado quem tem que garantir isso; e a construção de um sistema de financiamento que seja capaz de garantir investimentos locais. “Keynes surgiu com uma nova condição macroeconômica: a tendência à insuficiência de demanda”, observou Bresser. “É preciso que o Estado intervenha para garantir que haja demanda suficiente. A partir de 1936 este conhecimento tornou-se universal”.
Mas haver demanda não basta – e é aí que entra a teoria novo desenvolvimentista. “É preciso que haja acesso à demanda. A empresa que quer exportar ou vender para o mercado interno, numa economia razoavelmente aberta, precisa ter acesso á demanda. E ela pode não ter acesso se a taxa de câmbio for apreciada ao longo do prazo”, explicou Bresser. “Se isso acontecer, mesmo que haja demanda suficiente, as empresas não vão ter acesso a ela e não adianta nada. A teoria novo desenvolvimentista mostra que existe uma tendência à sobreapreciação cíclica e crônica de longo prazo. Se o Estado não cuidar disso, os países em desenvolvimento não se desenvolverão”.
Quando o câmbio está apreciado, os custos das empresas aumentam e as receitas em real diminuem. “Em consequência, elas não podem exportar, e se estiverem fornecendo para o mercado interno, as importações também acontecerão a um preço mais barato do que ela é capaz de produzir. É uma situação insustentável”, aponta o professor. “É preciso evitar isso. E esta é a principal mensagem do novo desenvolvimentismo”.
A taxa de câmbio tende a ser apreciada por duas razões. A primeira é que países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, tendem a ter permanentemente um déficit em conta corrente. Para financiá-lo, entram mais capitais do que saem, o que aprecia o câmbio. “As pessoas acreditam que quanto mais você recebe de empréstimos ou investimentos diretos, mais você cresce. O país se desenvolve quando recebe investimento e, se não receber, não vai crescer. Isso é absolutamente falso”, ponderou Bresser. “Quando você tem um déficit em conta corrente o câmbio se aprecia, as empresas não podem exporta, não podem enfrentar a competição e não investem. Trabalhadores e empresários de nível baixo, médio e alto e todos os rentistas ganham em poder aquisitivo e consomem mais. Então a poupança externa não se soma à poupança interna, mas substitui”.
A situação leva a um quadro de populismo cambial. “Os governantes querem ser reeleitos. Para isso, precisam de uma taxa de câmbio apreciada, que deixe todos felizes. Eles também querem fazer obras e para isso têm que tomar empréstimos, ou mostrar que atraíram multinacionais para a sua região”, argumentou o professor. “Do ponto de vista local, aquele município é beneficiado, mas para o Brasil como um todo não é bom, devido a este processo macroeconômico de caráter cambial”.
A teoria novo desenvolvimentista dá um papel fundamental à taxa de câmbio, mas também dá grande importância à taxa de juros. “Não se pode promover o desenvolvimento de um país se a taxa de juros for muito alta. Mas, infelizmente, nos países em desenvolvimento ela tem que ser relativamente alta”, explicou Bresser. “Existe uma taxa internacional, e a nossa precisa ser um pouco mais alta, porque temos o chamado risco-país. Se eles pagam entre 1% e 2% de juro real, podemos pagar mais 1,5%. Seria razoável. Não é bom, mas o que vamos fazer? Mas nós pagamos 7,5%, 8%. Não é aceitável”.
E por que a taxa de juros é tão alta? O novo desenvolvimentismo tem duas razões para explicar. “Uma é a política de crescer com poupança externa, tendo déficit em conta corrente. Você precisa atrair capitais e ter uma taxa atrativa para eles, mais do que simplesmente o risco-país”, comentou Bresser. “Mas há outro motivo: o poder dos financistas e dos rentistas que dominam nossa economia, e no Brasil essa gente é poderosa, porque esse poder vem de bastante tempo, e eles não aceitam que a taxa de juros real seja menos de 6%”.
Por fim, uma característica do novo desenvolvimentismo é o nacionalismo econômico – o que não é propriamente uma novidade, porque já estava presente no desenvolvimentismo clássico. Bresser aponta que os países ricos não querem que o Brasil se industrialize. “Como é que eles ganham conosco? De duas maneiras. Primeiro, exportação de capitais: o imperialismo nasceu na Inglaterra, quando havia capital sobrando e não havia mais investimento produtivo. Esse capital era exportado para gerar lucros em outros lugares. Exportar capital e receber juros, ou preferencialmente dividendos”, observou o professor. “Segundo, querem manter as trocas desiguais. Exportar para o Brasil produtos ou serviços sofisticados, com alto valor agregado per capita, e que pagam salários elevados, e importar commodities, mercadorias de baixo valor agregado per capita, que pagam baixos salários”.