Carta do Seminário sobre Políticas de Estabilização
Os expositores e mediadores do Seminário sobre Políticas de Estabilização, promovido pelo Cofecon, em parceria com o Corecon-DF, no dia 27 de julho de 2023, em Brasília, mostraram os valiosos benefícios dessas políticas, quando devidamente aplicadas, assim como as vultosas perdas de seus desvios. A meta deve ser controlar a inflação sem perdas no emprego e sem prejuízos à eficiência da intermediação financeira. Somente nos casos em que as pressões de demanda excederem os limites produtivos correntes, ações estabilizadoras usuais sob a responsabilidade do Banco Central são justificadas, não sendo apropriada a sua atuação para enfrentar pressões de oferta, decorrentes de condições como inflação importada e pressões de preços internos de grande potencial inflacionário.
No Brasil, a responsabilidade pelo controle da inflação está atribuída ao Banco Central pelo nosso ordenamento jurídico, Lei Complementar nº179, de 24 de fevereiro de 2021:
Art. 1º O Banco Central do Brasil tem por objetivo fundamental assegurar a estabilidade de preços.
Parágrafo único. Sem prejuízo de seu objetivo fundamental, o Banco Central do Brasil também tem por objetivos zelar pela estabilidade e pela eficiência do sistema financeiro, suavizar as flutuações do nível de atividade econômica e fomentar o pleno emprego.
Entretanto, o Banco Central possui instrumentos para atuar somente sobre a demanda. Tal circunstância não justifica que induza retrações nessa demanda além do que exceda a capacidade produtiva, na tentativa de reduzir pressões de oferta. O efeito sobre os preços, nos casos provocados por pressões de oferta, é pequeno, ou até nenhum.
Aumentos das taxas de juros desaquecem a atividade econômica, trazendo estagnação e desemprego, com custos sociais e fiscais inaceitáveis. Outras instituições públicas é que possuem os instrumentos para minimizar essas pressões de oferta, como impostos sobre importação e exportação, estoques reguladores, precificação de itens regulados, fortalecimento da defesa da concorrência em mercados com maior grau de concentração e promoção de investimentos em geração mais barata de energia.
É imprescindível que o regime de metas de inflação seja objeto de ampla discussão pela sociedade brasileira – a influência do Banco Central sobre os sentimentos e expectativas da sociedade, os incentivos proporcionados a seus diretores, o questionamento sobre a confiabilidade das pesquisas de expectativas de preços e atividade da economia e sua eventual modificação e a adoção de uma meta baseada em núcleos ou média de núcleos de inflação são elementos que devem compor esse exame minucioso da condução da política monetária brasileira.
Algumas medidas poderiam favorecer ao Banco Central manter o controle da demanda com taxas de juros menores. Seria o caso de avaliar a adoção de metas de taxas de juros longas, como faz o Banco do Japão desde 2016, com queda da volatilidade da curva. No Brasil, menor volatilidade permitiria menores níveis da curva de juros com o mesmo efeito sobre a demanda. Metas de taxas longas possibilitariam, ainda, substanciais reduções na taxa de um dia, que, por indexar quase metade da dívida pública e reforçar a função de quase moeda dessa parcela, diminuiria expressivamente a capitalização de toda a dívida e a concentração de renda que promove.
Outra medida que poderia baixar a percepção dos riscos atribuídos à dívida pública seria realizar ajustes em seus componentes, seguindo as mais recomendáveis práticas internacionais. Nesse sentido, as operações compromissadas, que têm oscilado em torno de 15% do PIB nos últimos 10 anos, poderiam passar para depósitos voluntários, que não integram o mais utilizado conceito de dívida pública, a Dívida Bruta do Governo Geral, mediante um diferencial de remuneração favorável a esses últimos. A carteira do Banco Central de títulos públicos, em torno de 22% do PIB nos últimos 10 anos, poderia ser redimensionada para atender as necessidades da autoridade monetária, incluindo uma margem de segurança. Em relação às reservas internacionais, em torno de 19% do PIB nos últimos 10 anos, a indicação de um redimensionamento é bastante controversa.
A taxa Selic está em um nível significativamente elevado, especialmente quando comparada em termos reais com as de outros países. Adicionalmente, o comportamento da inflação já confirma a tendência para o cumprimento do intervalo de tolerância da meta de inflação. Porém, a manutenção dessa elevada taxa Selic por um período muito elevado tem deprimido o potencial de crescimento da economia, inclusive devido à sua transmissão no mercado de crédito, cujas taxas de juros aos tomadores finais estão muito onerosas e restritivas. O setor produtivo e as tomadas de decisões de investimentos estão sendo forte e negativamente impactados.
Portanto, os participantes do seminário concluíram que, diante do comportamento recente da inflação e para evitar maiores impactos deletérios para o desempenho da economia brasileira, torna-se urgente iniciar um ciclo de cortes substanciais da taxa Selic a partir da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que ocorrerá no início de agosto.