Em Portugal, Dantas destaca importância dos Conselhos e propõe taxação global 

  • 30 de setembro de 2024
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Presidente do Cofecon falou sobre fiscalização profissional, atualização da Lei 1.411, um tributo para combater a pobreza e a fome e fez uma homenagem a Maria da Conceição Tavares 

O presidente do Cofecon, Paulo Dantas da Costa, participou nesta sexta-feira (27) do 2º Fórum de Economistas da Associação Lusófona de Economia (Alecon). Ele foi um dos oradores durante o terceiro painel, que teve como tema o papel das instituições representativas dos economistas. Os debates foram transmitidos pelo facebook e podem ser vistos AQUI. 

Dantas destacou que a estrutura de Conselhos e Ordens profissionais veio da influência portuguesa. “Esta estrutura tem sido fundamental para garantir que as chamadas profissões regulamentadas sejam exercidas no país com a devida qualidade e ética”, afirmou o economista. “Os Conselhos de fiscalização profissional funcionam como órgãos reguladores, responsáveis por definir normas e fiscalizar o exercício das profissões, e atuam como uma ponte ente os profissionais, o Estado e a sociedade, garantindo que elas sejam exercidas de acordo com normas e padrões estabelecidos”. 

Na sequência, o presidente do Cofecon tratou da Lei 1.411, que regulamentou a profissão de economista no Brasil, e da necessidade de sua atualização. “Ela não define claramente os campos de atuação do economista, o que constitui um problema real”, apontou Dantas. “Desde agosto temos um projeto de lei tramitando no Congresso brasileiro para resolver esta questão. Espero, de verdade, que este projeto se transforme em lei e nos permita atuar com mais clareza e força em prol dos brasileiros, do desenvolvimento, no combate às desigualdades e na criação de um país mais justo”. 

Passando para o papel dos economistas no mundo, Dantas mencionou os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas, em especial os dois primeiros (acabar com a pobreza e a fome). “Parece uma meta ambiciosa, e de fato é, mas até agora pouco foi feito para que eles sejam alcançados”, comentou. “Os líderes globais deixaram previstas as formas de financiamento dos objetivos programados, pelo aporte de 0,7% do PIB das grandes nações e 0,15 a 0,20% do PIB dos países em desenvolvimento. Contar apenas com a generosidade das nações mais ricas para resolver a fome mundial é uma abordagem que já provou ser insuficiente. O ciclo de doação não é sustentável a longo prazo”.  

Assim, o presidente do Cofecon defendeu a criação de uma tributação internacional. “Essa é tarefa para nós, economistas, que estamos tratando de emprego e renda, que estão dentro do objeto da nossa muito querida ciência”, observou, propondo uma taxação sobre as transações cambiais que, a uma alíquota de 0,1%, teria potencial para arrecadar US$ 2 trilhões por ano. “Este dinheiro poderia ser investido nas nações mais pobres para combater a fome e a pobreza. E o melhor, não afetaria a livre movimentação de capitais, mas ainda ajudaria a combater a lavagem de dinheiro e os paraísos fiscais”. 

Por fim, Dantas fez uma homenagem a Maria da Conceição Tavares. “Uma mulher extraordinária que uniu Brasil e Portugal com sua inteligência e determinação. Ela tornou-se uma das economistas mais brilhantes do nosso país. Ela nos deixou em junho deste ano, e sua contribuição para a nossa ciência é imensurável”. 

Leia na íntegra o discurso do presidente do Cofecon:

Boa tarde a todas e a todos! 

É uma grande honra estar aqui representando o Conselho Federal de Economia, do qual sou presidente. O Conselho, conhecido pela sigla Cofecon, é o órgão responsável por disciplinar e fiscalizar o exercício da profissão de economista no Brasil, cabendo ainda o papel institucional de representação dos profissionais brasileiros. 

Mas, inicialmente, entretanto, pretendo falar sobre algo além das nossas responsabilidades. Quero falar sobre a nossa história, a importância do que fazemos, e, mais importante, como podemos nos reposicionarmos diante dos desafios que temos para o futuro

Vou começar com nossas raízes. Muitas vezes não ressaltamos um ponto importante de nossa história, mas quero lembrar aqui que a estrutura de Conselhos e Ordens profissionais que temos hoje, veio de vocês, nossos irmãos portugueses. Portugal nos influenciou diretamente na criação dessas instituições, e a primeira foi a Ordem dos Advogados do Brasil, fundada em 1930. Logo depois, vieram os Conselhos de Medicina, Engenharia, Economia e tantos outros.  

Com isso, temos hoje no Brasil 32 profissões regulamentadas, cada uma desempenhando um papel essencial para a qualidade e a ética nas suas respectivas áreas, buscando atender os interesses da sociedade. 

Mas por que isso é importante? Esta estrutura tem sido fundamental para garantir que as chamadas profissões regulamentadas sejam exercidas no País com a devida qualidade e ética. Quando falo em profissões regulamentadas me refiro àquelas que passaram a ter vida jurídica porque criadas por lei.  

E os Conselhos de fiscalização profissional funcionam como órgãos reguladores, responsáveis por definir normas e fiscalizar o exercício das profissões, e atuam como uma ponte entre os profissionais, o Estado, e a sociedade, garantindo que as profissões regulamentadas sejam exercidas de acordo com normas e padrões estabelecidos. 

Não devo deixar de mencionar que vivemos num país de desafios enormes. Em cada canto do Brasil, há economistas trabalhando em áreas tão diversas, enfrentando problemas complexos. O impacto do nosso trabalho é gigante. E isso me leva a uma das grandes questões que precisamos discutir: a nossa lei. 

A Lei 1.411, do ano de 1951, que regulamenta a nossa profissão, está desatualizada. Desde que ela foi sancionada, o mundo mudou profundamente. No Brasil vivemos períodos que vão desde a era desenvolvimentista até a década perdida de 1980, passando pela abertura comercial e pela globalização. A lei que rege a nossa profissão precisa estar adequada aos desafios contemporâneos que enfrentamos. 

E, no entanto, essa mesma lei continua praticamente a mesma de 73 anos atrás, quando foi aprovada. Isso nos limita. Ela não define claramente os campos de atuação dos economistas, o que se constitui num problema real. 

Nesse particular, cabe o registro de um fato ocorrido há cerca de 15 anos, quando desempenhava a direção do órgão regional dos economistas do Estado da Bahia. Na altura, tive uma conversa com um diretor do Banco do Nordeste do Brasil, um banco público, a quem eu explicava que somente economistas deveriam ser responsáveis por estudos de viabilidade econômica. Ele concordou, mas me disse: “Eu também sou economista, mas não posso atender ao seu pedido se não houver uma lei que assim me obrigue”.  

Esse fato me marcou profundamente. E é por essa razão que, desde agosto passado, temos um projeto de lei tramitando no Congresso Brasileiro para resolver essa questão. Espero, de verdade, que este projeto se transforme em lei e nos permita atuar com mais clareza e força em prol dos brasileiros, do desenvolvimento, no combate às desigualdades e na criação de um país mais justo. 

Como os senhores e senhoras podem observar, o desempenho das atividades profissionais no Brasil são muito ligadas à lei. 

Mas não estamos aqui apenas para falar de desafios internos. Existem questões globais que afetam a todos nós, e como economistas, temos a responsabilidade de buscar soluções criativas e eficazes.  

Nesse contexto, então, destaco que em setembro do ano de 2015, a ONU, em reunião na cidade de Nova York, com a participação de 193 Estados-Membros, aprovou formalmente a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, um conjunto de 17 objetivos globais que visam enfrentar os maiores desafios do nosso tempo. Entre eles, destaco os dois primeiros, que são fundamentais: o objetivo 1. acabar com a pobreza em todas as suas formas e o objetivo 2. Acabar com a forme, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável. Parece uma meta ambiciosa, e de fato é, mas aqui está o problema: até agora, pouco foi feito para que esses objetivos sejam alcançados. 

E os líderes mundiais ainda deixaram previstas as formas de financiamento dos objetivos programados, sendo pelo aporte de 0,7% do PIB das grandes nações e de 0,15 a 0,20% do PIB dos países em desenvolvimento. 

Contar apenas com a generosidade das nações mais ricas para resolver a fome mundial é uma abordagem que já provou ser insuficiente. Não podemos esperar que as contribuições voluntárias por parte dos países ricos sejam a única solução, porque o ciclo de doação não é sustentável a longo prazo. Quem está faminto não pode ficar à mercê da generosidade de outros. Quem está em situação de fome precisa de oportunidades, que são geradas por investimentos em diferentes setores e acompanhadas por geração de empregos e por políticas públicas eficientes. No papel de economistas, precisamos propor e executar soluções mais estruturadas, duradouras e, acima de tudo, sistemáticas. 

Diante dessa realidade, a pergunta é: Carecemos de uma solução?  

Nesse sentido, a proposta para criação de um novo tributo internacional sobre transações cambiais, no contexto de uma nova governança internacional, parece muito indicada.  

Tarefa para nós economistas. 

Os que estudam a matéria, desde James Tobin, na década de 1970, têm delineado o conjunto de elementos que configurariam este tributo. Imaginem: se arrecadarmos 0,1% de todas as transações cambiais, que somam trilhões de dólares todos os dias, poderíamos levantar quase 2 trilhões por ano! Esse dinheiro poderia ser investido nas nações mais pobres para combater a fome e a pobreza. E o melhor: não afetaria a livre movimentação de capitais, mas ainda ajudaria a combater a lavagem de dinheiro e os paraísos fiscais. Uma ideia simples, mas revolucionária. Peço que imaginem mais uma vez o impacto disso nas nações mais pobres, nas regiões mais afetadas pela fome e pobreza. 

Esse conceito é mais do que uma simples proposta de tributação. Ele representa, como mencionei, uma nova governança internacional, onde nações e instituições globais se juntam para combater de forma coordenada e eficaz os grandes problemas sociais. O desafio agora é transformar essa ideia em realidade, criando uma estrutura legal e política que permita sua implementação. 

Uma coisa é certa: não podemos mais nos dar ao luxo de esperar. A fome é uma realidade cruel para milhões de pessoas todos os dias. E soluções como essa, que trazem inovação e viabilidade econômica, são o caminho para um futuro mais justo. É uma ideia que precisa ser discutida, defendida e, acima de tudo, implementada. 

E, finalmente, para encerrar a minha fala, quero prestar uma homenagem a uma mulher extraordinária que uniu Brasil e Portugal com sua inteligência e determinação. Maria da Conceição Tavares, nascida em Portugal, emigrou para o Brasil em 1954, aos 23 anos, e se tornou uma das mais brilhantes economistas do nosso país. Ela nos deixou em junho deste ano, aos 94 anos, e sua contribuição para a nossa ciência é imensurável.  

Para concluir, quero deixar um pensamento: nossa profissão está em constante evolução. Vivemos num mundo cada vez mais conectado, onde o conhecimento flui rapidamente. Precisamos intensificar nossas trocas de experiências, expandir nossas relações com nossos irmãos de língua portuguesa e outros países. O diálogo é o caminho para crescermos como economistas, buscando entregar à humanidade o que de melhor a nossa sagrada ciência econômica pode oferecer.  

Obrigado a todos. 

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