“Não dá pra retomar o desenvolvimento sem um Estado forte”
Presidente do Cofecon participou como debatedor de painel no V Congresso Internacional do Centro Celso Furtado sobre desenvolvimento, democracia e projeto nacional
Rompimento de paradigmas, necessidade de reindustrialização, retrocesso econômico e desafios para as eleições foram alguns dos aspectos discutidos no painel “Desenvolvimento, democracia e projeto nacional – dilemas e perspectivas a partir do Brasil”. O debate fez parte da programação do V Congresso Internacional do Centro Celso Furtado, organização que sistematiza e formula projetos sobre temas do desenvolvimento. Na ocasião, o presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Antonio Corrêa de Lacerda, participou como debatedor.
Lacerda reforçou que o grande desafio para o próximo governo é o resgate da governabilidade e governança. “Não dá para retomar o desenvolvimento sem um Estado forte”, afirmou. E o papel da governança é restabelecer os próprios instrumentos de atuação, já que, segundo o presidente do Cofecon, houve um “apequenamento da visão de política econômica” com a racionalização dos ministérios. Fazenda, Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Indústria, Comércio Exterior e Serviços, e Trabalho se tornaram um só ministério: o da Economia.
Evento contou com a presença de outros pesquisadores e economistas
A programação ocorreu na última sexta-feira, 19 de agosto, de maneira on-line, no encerramento do Congresso. Participaram como expositores Ricardo Bielschowsky, professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); André Singer, cientista social e jornalista pela Universidade de São Paulo (USP); e Paulo Nogueira Batista Junior, economista e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV). A mediação ficou por conta de Salvador Werneck, economista e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Lacerda iniciou ressaltando a importância do painel, “cuja temática é oportuna e extremamente relevante”. Também relembrou Celso Furtado – que, com suas obras, discorreu sobre a existência de projetos nacionais no Brasil em períodos de democracia e ditadura. Mas que, a partir de 1980, foram substituídos para planos de estabilização de curto prazo, a fim de combater a inflação.
Segundo Lacerda, durante os governos Lula e Dilma houve tentativas de restabelecer um projeto de desenvolvimento. Contudo, desde 2016, há predominância de ideias neoliberais.
É preciso resgatar a governança e a governabilidade
A matriz exposta por Bielschowsky “é um esforço metodológico de sistematização de um projeto de desenvolvimento”. Cada frente, se relacionada a setores sociais, ambientais e produtivos e podem gerar políticas públicas essenciais para criação de emprego e renda para as pessoas e de mercado para empresários. “A gente pode vender isso (a matriz) para a juventude. O Brasil tem futuro, já movimentou de forma virtuosa várias dessas frentes, e todos ganham se for colocado para frente”, sintetizou Bielschowsky.
André Singer destacou o momento delicado da economia e do ano eleitoral. Ao comentar este ponto, Lacerda alertou para o fato de que “não basta vencer as eleições, é preciso estar atento ao que se propõe, a partir dos resultados, em termos de governabilidade e de políticas econômicas”.
Segundo a última pesquisa divulgada pelo Datafolha, metade do eleitorado é composto por famílias com renda que não ultrapassa dois salários mínimos. Para André Singer, “estamos ainda diante de um vasto contingente que Paul Singer chamaria de subproletariado, pessoas sem carteira de trabalho. “O desafio básico da retomada de um projeto de desenvolvimento seguirá sendo integrar essa metade do país, que equivale à Turquia, ao patamar civilizatório já alcançado pela outra metade”, argumentou Singer.
Armadilhas de liberalização
Teto de gastos, ou “teto de investimentos”, como definido pelo presidente do Cofecon em diferentes oportunidades, foi o tema abordado por Paulo Nogueira, que fez uma crítica das escolhas da economia brasileira, do ponto de vista macroeconômico, nos últimos 30 anos. Na oportunidade, Lacerda reforçou seu ponto de vista sobre limitar a expansão do gasto público, principalmente, e não somente, os investimentos em saúde, ciência e tecnologia, infraestrutura, políticas públicas e educação.
Nogueira fez uma homenagem a Bresser-Pereira, “um dos mais proeminentes economistas da geração posterior à de Celso Furtado”. Para ele, Bresser tentou resumir o que se teve no Brasil como “armadilha da liberalização”. “Trata-se da adoção prematura e arriscada de medidas de abertura comercial e financeira”, explicou.
Em suas palavras finais, o presidente do Cofecon, reforçou que “sem uma política macroeconômica e um conjunto de políticas de competitividade, não é possível dar o passo necessário a uma reindustrialização que dê conta da transição digital, energética, economia verde e biodiversidade – áreas em que o Brasil tem grandes potencialidades”.
Para conferir o debate na íntegra, acesse o player abaixo: