Artigo – O contrato previdenciário e a credibilidade

  • 1 de fevereiro de 2017
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A Proposta de Emenda Constitucional nº 287- 2016 (PEC 287) renovou o interesse para as regras do Regime Geral de Previdência Social.

Ao explicá-las a Ana, uma jovem de 21 anos, ela comentou: “É como um contrato: eu contribuo e o Estado me aposentará, quando tiver a idade e o número de contribuições pactuadas. Contudo, quem me garante que, nesse meio tempo, as regras não sejam alteradas?”.

As aposentadorias são pagas pelas contribuições dos trabalhadores ativos e de seus empregadores, bem como por outras receitas tributárias do Estado. Nos mais de 30 anos de período contributivo médio de um segurado, é comum haver alterações do valor de contribuições e benefícios e da idade de aposentadoria, entre outros.

Em geral, trata-se de ajustes paramétricos para manter o equilíbrio entre receitas e despesas. Na PEC 287, há ajustes estruturais propostos para cortar custos e isentar o Estado de sua responsabilidade no custeio do sistema, mas prejudicam a proteção previdenciária.

Veja-se o exemplo de João: pela lei em vigor, em 2 anos, ele se aposentaria com R$ 2.635,00, com 360 meses de contribuição e 65 anos de idade, 7 a mais do que a média brasileira, hoje de 58 anos.

Se aprovada hoje, a PEC 287 aumentaria o período contributivo e o benefício seria de R$ 2.040,00 (perda de 22%), insuficiente para as despesas dos 30 dias do mês, conforme João se planejou, dando conta de apenas 23 dias.

A mensagem é cínica: “João, trabalhe mais 19 anos e não terá perdas”. Boas reformas previdenciárias têm equidade: abrangem todos os segurados em atividade e são aplicadas apenas ao futuro, sem substituir as regras anteriores em relação ao passado. No caso de João, a regra atual deveria ser aplicada com peso de 28/30, pois vigorou por 28 anos, e a nova regra teria peso de 2/30, resultando no benefício de R$ 2.596, reduzindo a perda para 1,5%.

A PEC 287 vem confirmar o temor da jovem Ana de que o Estado descumpra a sua parte do contrato previdenciário. Contudo, trata-se apenas de uma proposta, que a sociedade pode debater e melhorar.

A quem diz que o remédio da PEC 287 é amargo, mas necessário, cabe responder que o Estado possui recursos para cumprir a sua parte no financiamento tripartite. E, ainda, que se a previdência não proteger os cidadãos e não os convencer de que o sistema é justo e confiável no longo prazo, não cumprirá sua missão.

Sem a aplicação proporcional das novas regras, o sistema perderá credibilidade, pois os segurados entender-se-ão como enganados e punidos, passando a evitar as contribuições, sempre que possível.

De fato, cabe aos segurados decidir essas contribuições quando ficarem sem vínculo empregatício (5 ou 6 anos ao longo de sua vida, em média) ou se pertencerem aos 15 milhões que trabalham por conta própria. A perda de credibilidade exigirá décadas para ser revertida.

Enquanto isso, o sistema falhará: não atingirá o objetivo constitucional de universalidade (proteger todos os trabalhadores) e também sofrerá por via da queda da receita das contribuições dos segurados. Patrimônio da sociedade brasileira, a previdência social, nestes dias, completa 94 anos. Ela e a sua credibilidade devem ser defendidas.


Luciano Fazio é consultor previdenciário e autor do livro “O que é Previdência Social” – Ed. Loyola. Artigo originalmente publicado no jornal A Tribuna, de Vitória.

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