O Estado parece que não tem dono
Artigo publicado originalmente no jornal O Globo, em 30 de março de 2022
Não se sabe como os recursos das emendas parlamentares são usados e isso reflete a falta de amadurecimento da cidadania no Brasil. O conjunto da população não acompanha o processo orçamentário. Se você pegar lideranças empresariais e sindicais, eles também não sabem. É uma questão gravíssima. Há um desconhecimento generalizado sobre o plano plurianual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
O Estado parece que não tem dono. Cada um faz o que quiser. Parece um saco sem fundo, mas não é nada disso. As verbas públicas têm que ser muito bem empregadas. Cada um puxa a brasa para sua sardinha sem pensar nos interesses da sociedade. Lógico que o deputado tem que olhar a região que representa. Agora, ele tem que pensar no conjunto do país. O Executivo é que tem a noção de planejamento, dos problemas, se falta dinheiro para educação, saúde, escolas, hospitais. O deputado está lá com uma visão mais localizada.
Essas emendas secretas, no meu entender, foram criadas pelo atual governo para evitar o impeachment do presidente. É uma distribuição de verbas entre os deputados do Centrão, base que apoia o presidente. E como ele conseguiu uma certa estabilidade, elas agora são usadas do ponto de vista do interesse da reeleição do presidente. É uma coisa absurda.
Orçamento é uma peça fundamental de planejamento e de transparência. A Lei de Responsabilidade Fiscal coloca que o Orçamento tem que ser o mais transparente possível para o atender o planejamento. É um equívoco enorme o país hoje viver nessa situação para atender interesses do pre sidente e de seu entorno. Essa é uma questão que não podemos deixar passar.
E dada a crise que estamos vivendo no país, desde 2014, há perda de receitas. Por um lado, tem aumento das despesas secretas, e por outro tem a diminuição do Orçamento, que acaba impactando os chamados gastos discricionários, que é onde há liberdade para investir em educação, saúde, pesquisa.
Perdemos a noção de planejamento, que é decisivo para o Estado. E aí não é um problema ideológico, de esquerda ou direita. O Estado tem que planejar para atender os interesses da sociedade.
Por Odilon Guedes Pinto Júnior é conselheiro do Corecon-SP e professor de Economia do Setor Público na FAAP