Artigo – O santo é de barro
Há exatamente 52 anos um golpe instalou a ditadura militar no País, inaugurando uma era de perseguição, tortura e privação de direitos. Volta à tona a questão da ruptura institucional, agora e em 1964, patrocinada pelo mercado financeiro e grandes corporações, respaldados pela classe média conservadora, a grande mídia e a Fiesp, tendo a tardia adesão da OAB, que também apoiou o golpe militar em 1964.
Diante da fragilidade dos argumentos apresentados para o impeachment – as pedaladas fiscais também foram feitas por ex-presidentes e continuam com os atuais governadores; a prática de caixa dois é a regra em todas as principais campanhas eleitorais – o mote para destituir a presidente passou a ser a crise econômica, o que tampouco se sustenta, pois inúmeros países enfrentaram e enfrentam quedas no PIB sem ruptura institucional.
O fato é que a rapidez com que se busca a destituição da presidente Dilma só não é maior que a avidez em se negociar os termos do novo governo Temer. De que maneira o programa econômico “Uma ponte para o futuro”, apresentado pelo PMDB, e que está sendo abraçado pela oposição, enfrentaria a aguda crise econômica? A resposta é óbvia: jogando o ônus do ajuste fiscal nas costas da classe trabalhadora, com reforma da previdência social, fim da política de valorização do salário mínimo e forte corte nos programas sociais, preservando-se e ampliando-se os privilégios do grande capital. Golpear as conquistas sociais é o propósito inconfessável do golpe.
É bom, contudo, irem devagar com o andor porque o santo é de barro. Alguém em sã consciência acredita que o retrocesso social seria feito sem resistência? As centrais sindicais e os movimentos sociais, que já estão profundamente insatisfeitos com a condução vacilante do governo Dilma, ficariam de braços cruzados? O palco migraria da Paulista para o ABC.
Júlio Miragaya – Economista, doutor em desenvolvimento sustentável.