Pequena história da regulamentação da profissão de economista – 70 anos a serviço do Brasil

  • 12 de agosto de 2021
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Trecho adaptado do discurso do economista Ubirajara Dib Zogaib (6º. Presidente do SINDECON-SP e 1º. Presidente do CORECON-SP), pronunciado em 16/11/1953, quando da instalação do então Conselho Regional de Economistas Profissionais da 2ª. Região (hoje Conselho Regional de Economia da 2ª. Região – São Paulo), e extraído do livro “História do CORECON-SP), publicado em 2008. 

“Sob a legislação de 1945, surgiram os primeiros cursos de Ciências Econômicas e de Ciências Contábeis em universidades públicas (já que estas não haviam criado os cursos de Administração e Finanças). No Rio de Janeiro, isto se deu na Universidade do Brasil (organizada em 1937, hoje a Universidade Federal do Rio de Janeiro) pela incorporação da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas do Rio de Janeiro, num esquema híbrido público/privado. Somente em 1949 houve a plena estatização da faculdade. Em São Paulo, no interior da Universidade de São Paulo, foi criada em 1946 a Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas com os cursos de Ciências Econômicas e de Ciências Contábeis e Atuariais.

Com a legislação de 1945, os economistas alcançaram o objetivo de equiparar o “status” do curso superior de Economia ao dos demais cursos universitários. Restava ainda uma questão: se a profissão de contador, ainda como de nível técnico, já fora reconhecida em 1931, cabia lutar pela regulamentação da profissão de economista. Evidentemente, o crescente número de economistas formados e de estudantes de economia era um importante elemento a impulsionar a campanha para o reconhecimento legal da profissão.

Para tanto, reuniram-se as forças das entidades de economistas, principalmente os sindicatos do Rio de Janeiro e de São Paulo que já abrigavam um número elevado de associados. Em 1943, numa moção enviada ao Presidente e ao ministro da Educação sobre a reforma do ensino, o sindicato de São Paulo conseguiu somar mais de 500 assinaturas de economistas e professores. Estimava-se que, em 1945, as faculdades de São Paulo que ministravam o curso de Administração e Finanças haviam formado cerca de 500 bacharéis. No Rio de Janeiro, esse número deveria ser mais elevado considerando aqueles que haviam ingressado na Faculdade de Ciências Políticas e Econômicas (da Academia de Comércio) desde 1909.

Alguns passos para o reconhecimento da profissão haviam sido dados anteriormente. Como já nos referimos, em 1935, a Ordem dos Economistas de São Paulo [nota: hoje Sindicato dos Economistas no Estado de São Paulo] obteve um parecer favorável do Chefe da Seção de Fiscalização do Departamento Estadual do Trabalho quanto ao seu reconhecimento como entidade sindical dos economistas. Outro passo foi dado em 1940 quando a profissão de economista foi incorporada à relação oficial das profissões liberais por ato do Governo Federal, ato incorporado à Consolidação das Leis do Trabalho pelo Decreto-Lei n° 5.452 de 1° de maio de 1943. Em 1945, o ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, Alexandre Marcondes Filho, criou a Comissão Federal de Economia Profissional, embora essa comissão nunca tenha sido instalada.

De qualquer modo, esses fatos indicam o amadurecimento da noção de que ser “economista” constituía efetivamente uma atividade profissional específica e diferenciada de qualquer outra existente. No entanto, o longo e difícil caminho para se chegar à regulamentação da profissão em 1951 sugere que esse reconhecimento também sofria sérias resistências, de modo a exigir ação mais incisiva dos próprios economistas. Ainda em 1945, os economistas encaminharam um memorial ao Presidente da República solicitando a regulamentação da profissão. O economista gaúcho Fernando Ferrari assim relatou como se deu a entrega do memorial: “No segundo semestre do ano de 1945 tomamos parte numa Comissão de Economistas do Sindicato do Rio de Janeiro que foi levar ao Presidente Getúlio Vargas as reivindicações mínimas da classe. O memorial apresentado ao Presidente, após algumas palavras suas de estímulo e de solidariedade, mereceu dele um rápido fixar de olhos e, em seguida, estas palavras: Já é tempo de se regulamentar essa profissão”.

O Presidente Getúlio Vargas recebe o memorial em que era solicitada a regulamentação da profissão por uma delegação de economistas: Heitor Campelo Duarte, presidente do Sindicato dos Economistas do Rio de Janeiro, e Dorilo Queiroz de Vasconcelos, Eduardo Lopes Rodrigues e Mario Orlando de Carvalho, 1945. Apesar dessa declaração de Vargas, o anteprojeto encaminhado junto com o memorial passou por comissões com membros do Ministério do Trabalho, da Educação e Saúde, da Fazenda e da Justiça e dos Negócios Interiores, e acabou engavetado. O economista Fernando Ferrari descreve a reação dos economistas: “Face o silêncio do Poder Público, os estudantes de Economia e Finanças, em todas as escolas superiores do país, e os bacharéis, reiniciaram a campanha com redobrado ardor. Todas as tribunas universitárias da Pátria repetiram o brado de luta. Era inconcebível que se pudesse mandar para as faculdades centenas e centenas de acadêmicos sem que estes soubessem, pelo menos, que fariam depois de formados”.

Nessa nova fase da campanha procurou-se encaminhar a regulamentação da profissão por meio do legislativo. Assim, em agosto de 1947, o deputado Pedroso Júnior apresentou projeto sob número 618 dispondo sobre o exercício da profissão de economista. Tratava-se de projeto sucinto, com apenas 13 artigos que definiam quem poderia desempenhar as funções de economista e quais os cargos e as atividades que seriam prerrogativas dos economistas. Em outubro de 1947, o deputado Bertho Conde apresentou o projeto número 802 que criava o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Economistas Profissionais. Seguindo os trâmites normais, o Projeto 618/47 passou pela Comissão de Constituição e Justiça e na Comissão de Educação e Cultura, onde sofreu apreciação mais profunda e recebeu parecer favorável de seu relator, o deputado Barros Carvalho, que apresentou um substitutivo, que foi amplamente discutido pelos membros da comissão e aprovado com emendas numa das últimas reuniões da sessão legislativa de 1947. As nossas principais reivindicações foram mantidas.

Fundidos na Comissão de Finanças os dois projetos, o substitutivo foi para o Senado em dezembro de 1948, de onde só voltou para a Câmara em 1950 e com diversas emendas.

Em 2 de junho de 1950, o projeto com as emendas é distribuído ao deputado Carlos Medeiros para receber parecer na Comissão de Educação e Cultura da Câmara. Em 8 de junho de 1950, isto é, seis dias após, a comissão aprovava o parecer do deputado Medeiros, apenas aceitando uma das emendas do Senado.

O ano de 1950 foi o mais renhido da luta para a aprovação do projeto. É que se encerrava a legislatura. O projeto, se não fosse aprovado, seria arquivado e a renovação da Câmara traria a necessidade de começar tudo de novo, perante novos deputados que não haviam acompanhado a matéria.

Porém, com o parecer da Comissão de Educação e Cultura vai o projeto a Plenário no dia 15 de junho de 1950. Estava no Plenário para discussão única e votação final no dia 22 de junho de 1950, quando as ‘forças ocultas’ voltaram a agir e são aprovados dois requerimentos no sentido de ser enviado o projeto para audiência às Comissões de Constituição e Justiça e à Comissão de Economia.

Eis que 29 de junho assinala um dia negro para a classe dos economistas brasileiros. O projeto de regulamentação profissional é, nesse dia, distribuído ao então deputado Eduardo Duvivier, na Comissão de Constituição e Justiça, para relatar. Esse ex-deputado, cujo nome ficou marcado como do maior inimigo de nossa classe, apesar de todos os apelos que lhe foram dirigidos de todas as partes do país, por todas as classes sociais, só se decidiu a manifestar-se sobre o projeto no dia 3 de novembro de 1950, mais de quatro meses após receber o processo, para proferir o mais nefando parecer contra o projeto e contra a classe dos economistas, injuriando até gratuitamente com torpes ironias o maior batalhador por esta causa, o Dr. Reynaldo de Souza Gonçalves. Nesse mesmo dia foi aprovado o parecer do Sr. Duvivier, no qual se declarava pela rejeição do projeto, mas como isso era impossível nessa segunda fase de tramitação na Câmara, que se fizesse o maior mal possível ao projeto, que se aprovassem as emendas supressivas do Senado.

Mas, Deus está sempre com as boas causas, e houve prorrogação dos trabalhos da Câmara e, em 15 de janeiro de 1951, foi o projeto a Plenário para discussão e votação final. Mesmo assim o suplício dos economistas não terminara. Estava tendo início a discussão das emendas quando foram encerrados os trabalhos da legislatura.

Reaberta a Câmara, com os novos deputados, tivemos a felicidade de ver entre eles o economista Fernando Ferrari, que desempenhou papel decisivo na fase final de aprovação do projeto que não foi arquivado porque já estava em Plenário ao encerramento da legislatura.

Aprovado finalmente vai à sanção Presidencial, tendo decidido o Sr. Presidente da República apor o seu veto a alguns dispositivos, veto esse que foi aceito pelo Congresso. Assim, no dia 13 de agosto de 1951, o Sr. Presidente da República sanciona a Lei n° 1.411, que dispõe sobre a profissão de economista.

No dia 31 de dezembro de 1952 é assinado o Decreto n° 30.353 que cria uma Comissão para regulamentar a Lei n° 1.411 e no dia 17 de novembro de 1952 o Decreto Federal n° 31.794 aprovava esse regulamento.

Estava completada a legislação sobre a profissão de economista e superada no Brasil a fase de empirismo nos estudos econômicos”.

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