Podcast Economistas: Você pegaria um empréstimo com 400% de juros?

  • 6 de setembro de 2024
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Segundo o SPC, cerca de 38% dos inadimplentes no Brasil possuem compras parceladas no cartão de crédito em atraso. Economista Edval Landulfo fala sobre o assunto

Você pegaria um empréstimo se soubesse que a taxa de juros é de 400% ao ano? Por mais que a pergunta pareça absurda, essa é a realidade de muitos brasileiros e o economista Edval Landulfo fala sobre o assunto na edição desta semana do podcast Economistas. Ele é especialista em controladoria e finanças e vice-presidente do Conselho Regional de Economia da Bahia. O podcast pode ser ouvido em sua plataforma preferida ou no player abaixo.

Um dos maiores vilões da inadimplência e do endividamento no Brasil é o cartão de crédito. De acordo com dados do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC), cerca de 38% dos inadimplentes possuem compras parceladas no cartão de crédito em atraso.

“Infelizmente aprendemos a ter crédito antes da educação financeira. As pessoas usam o cartão como um refúgio para aquele dinheiro que não deu para completar o mês e buscam esta forma de crédito para comprar, principalmente, bens de consumo ou algum serviço imediato, sem fazer um planejamento”, explica Landulfo. “Elas usam o cartão de crédito como uma extensão do salário, e isso fica complicado quando se tem uma renda limitada. Aquele pouquinho vai criando um grande problema financeiro. Quando falamos de rotativo, é preciso primeiro ter um entendimento de juros compostos”.

Uma situação bastante comum é a de um consumidor não conseguir pagar o valor total da fatura do cartão. Neste caso, haverá uma cobrança de juros sobre o valor não quitado, fazendo com que a dívida aumente – o que pode atrapalhar de forma decisiva o planejamento de uma pessoa em relação à sua renda.

“Esse valor restante terá um acréscimo de juros e encargos no mês seguinte, e a pessoa vai pagar, além da fatura já programada para o mês posterior, esse restante que não foi pago, e vai ter algo entre 13% a 16% de juros”, comenta o economista. “O ideal sempre é procurar não entrar nesta ciranda financeira negativa e fazer um planejamento. Se por acaso isso não for possível, o ideal é que busque a forma de liquidar essa dívida sem se endividar mais”.

A troca de uma dívida mais cara por outra mais barata é um passo que precisa ser dado com atenção. “Precisamos entender, para não cair numa nova cilada, saber se assumir aquela obtenção de crédito não vai impactar negativamente no meu orçamento e criar uma nova complicação para pagar aquele empréstimo”.

Recentemente a Lei 14.690, de 03 de outubro de 2023, estabeleceu que os emissores de cartão de crédito deveriam submeter anualmente ao Conselho Monetário nacional limites para as taxas de juros e encargos financeiros cobrados no crédito rotativo e no parcelamento do saldo devedor das faturas, e que se os limites não fossem aprovados em 90 dias, o total dos juros e encargos não poderá superar o valor original da dívida. Com o encerramento do prazo, a nova regra passou a valer para as dívidas feitas a partir de janeiro de 2024.

“Eu costumava brincar em sala de aula dizendo que para fazer uma dívida de 1 milhão com apenas 100 reais eram precisos apenas 52 meses, porque a dívida acumulava juros sobre juros. Agora essa brincadeira não serve mais”, comenta Landulfo. “O objetivo do Banco Central é que as pessoas não tenham tanta dificuldade para pagar ou fiquem sem crédito. A intenção é boa, mas, na prática, é uma dívida do mesmo jeito. É preciso ter atenção, as parcelas assumidas precisam caber no orçamento para que a pessoa não fique inadimplente e para que isso não venha acarretar novas negociações”.

Quando um consumidor tem uma dívida com uma operadora de cartão de crédito e considera que os juros cobrados são muito altos, ele pode buscar outra instituição financeira que ofereça juros menores e realizar a portabilidade da dívida. “Ela pode pedir um DDC, que é um Documento Descritivo de Crédito, com as informações daquela dívida. E leva para outra instituição, para que ela faça uma proposta. Com essa proposta em mãos, ela vai à emissora do cartão de crédito original”, informa o economista. “Quando você leva a proposta para a instituição original, ela tem um dia para responder se cobre ou não essa nova proposta. Se cobrir, ótimo. Se não, leva essa dívida para a instituição que ofereceu juros melhores. Lembrando que não deve haver cobrança nenhuma de taxas ou encargos para efetuar a portabilidade”.

Embora este instrumento tenha a intenção de fazer as instituições competirem entre si para oferecer juros menores, Landulfo acredita que, na prática, nem sempre vai acontecer. Isso porque as empresas não são obrigadas a apresentar uma proposta de juros menores e, além disso, elas dialogam entre si. Por isso, ele acredita que num primeiro momento os juros não cairão como o Banco Central espera. E também opina que aprender a organizar suas próprias finanças é mais importante do que aprender a negociar com outras instituições em busca de juros menores.

“Tudo o que vir para facilitar o pagamento dos juros por parte dos clientes será bem-vindo. É preciso conversar com especialistas da área para que este crédito se torne mais em conta e as pessoas possam utilizá-lo com sabedoria”, afirma. “Cartão de crédito nunca poderá ser extensão da renda quando a pessoa estiver em apertos. Por isso a educação financeira vem em primeiro lugar, para trazer a compreensão de que primeiro é preciso fazer o dinheiro e organizar as finanças para depois utilizar qualquer tipo de crédito”.

No caso de uma pessoa não conseguir pagar os juros de uma dívida com uma operadora de cartão de crédito, vale sempre a máxima de tentar trocar uma dívida mais cara por uma mais barata. O economista menciona, inclusive, a possibilidade de conseguir um empréstimo com algum amigo ou familiar que tenha dinheiro investido e no qual os juros sejam substituídos pelos rendimentos deste investimento.

“O ideal é abrir o jogo para estes entes e familiares. Se a pessoa tiver um investimento e você se propõe a pagar aquela rentabilidade, é muito melhor pagar a um amigo ou irmão do que pagar os juros de um empréstimo”, observa o vice-presidente do Corecon-BA. “Não tendo essa possibilidade, é preciso entar mais de uma vez, olhar atentamente para o orçamento e ver se consegue encaixar uma parcela para um crédito mais em conta e quitar esses juros mais altos. Sempre com a ressalva de que não pode ficar inadimplente. Nesse caso, em vez de uma dívida, a pessoa terá duas, três ou quatro”.

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