“Política econômica deve favorecer o desenvolvimento”, afirma Lacerda
“Política econômica deve favorecer o desenvolvimento”, afirma Lacerda
Após vários anos de crescimento baixo ou negativo, o Brasil vive uma situação econômica na qual o desemprego afeta uma parte importante da população; a desindustrialização reflete as falhas no planejamento do desenvolvimento; o Estado democrático de direito tem sido atacado; e as altas taxas de juros enriquecem os mais ricos, enquanto colocam os mais pobres em situação de grande vulnerabilidade. Este quadro foi apresentado pelo presidente do Cofecon, Antonio Corrêa de Lacerda, em palestra realizada na cidade de Salvador por ocasião do painel Perspectivas para um Novo Ciclo de Crescimento Econômico Nacional e Regional. O evento foi promovido pelo Corecon-BA, como parte das comemorações da semana do economista, e também contou com a presença do vice-presidente do Cofecon, Paulo Dantas da Costa.
Desemprego
O Brasil vive uma crise que já dura quase dez anos, e ela afeta desigualmente os brasileiros: o número de milionários e bilionários aumentou na crise, enquanto a população mais carente é também a mais afetada. E a ausência de crescimento gera desemprego. “Normalmente é divulgado o número de desempregados, são 10 ou 11 milhões de brasileiros, o que por si só é um escândalo”, comentou Lacerda. “Este número esconde outros dados representativos, porque há 5 milhões de desalentados, que saem da estatística de desemprego, e 10 milhões de subocupados, que não estão desempregados, mas não trabalham tanto quanto poderiam ou gostariam. Um quarto da população economicamente ativa está fora do mercado de trabalho. Estamos desperdiçando 25% do potencial de consumo, da contribuição tributária e da cidadania”.
Industrialização e planejamento
A junção dos ministérios da Fazenda, Planejamento, Indústria e Comércio e do Trabalho e Emprego – que anteriormente já havia incorporado a Previdência – no Ministério da Economia também foi mencionada. “Temos a falta de uma estratégia de desenvolvimento, um apequenamento da função pública de coordenação e de gestão da política econômica. Na prática, construiu-se um elefante branco que não está suficientemente equipado para dar conta dos enormes desafios que se apresentam, tanto do ponto de vista das desigualdades como de uma economia internacional em profunda transformação”, criticou Lacerda. “Durante a pandemia, o Brasil se viu às voltas com falta não apenas de hifas, que são princípios ativos para a fabricação de medicamentos, mas também de equipamentos básicos de proteção individual para o pessoal da saúde, como luvas, máscaras e gorros. Isso revela a importância de uma reindustrialização no Brasil”.
Mas esta reindustrialização deve enfrentar os desafios advindos da modernização tecnológica: a indústria 4.0, a tecnologia 5G, a internet das coisas, a nanotecnologia e a transição energética. “Temos uma matriz energética limpa e sustentável, mas sem planejamento governamental ela não é explorada adequadamente, e sem estratégia não se vai a lugar nenhum. E o Estado brasileiro perdeu esta capacidade de estratégia”, questionou Lacerda. “Celso Furtado, falecido em 2004, já alertava para a ausência da capacidade de planejamento, da função do Estado coordenar todo este processo. É preciso nos inspirarmos nos grandes economistas para resgatarmos a função clássica do Estado e da iniciativa privada, dos órgãos públicos na função do planejamento e coordenação de políticas que possam nos colocar novamente no caminho do desenvolvimento”.
Preservação do Estado democrático de direito
Em sua fala, Lacerda também apontou para a necessidade de preservar o Estado democrático de direito. “Hoje, 11 de agosto, marcou a divulgação da carta aos brasileiros em defesa do Estado democrático de direito, que ocorreu originalmente na Faculdade de Direito da USP, mas que repercutiu em várias universidades Brasil afora. Na própria PUC/SP participamos de um ato de leitura desta carta”, contou o presidente do Cofecon. “A economia só funciona com a preservação da liberdade democrática, para criar um ambiente favorável à condução de uma política econômica mais voltada ao setor produtivo, ao trabalhador, ao cidadão e menos ao rentismo”.
Juros, cidadania e eleições
Os juros da dívida pública deverão consumir, em 2022, cerca de 700 bilhões de reais. Lacerda comparou este número ao custo do programa Bolsa-Família, que atendia 50 milhões de pessoas e foi descontinuado pelo atual governo. “São 20 anos de Bolsa-Família. Esta é uma das debilidades que precisam ser enfrentadas mediante a retomada do uso da política econômica em prol do desenvolvimento e não do enriquecimento dos que já são ricos”, expôs. “A precarização dos serviços públicos tem colocado esta mesma população numa precariedade jamais vista”.
Após abordar a situação dos moradores de rua, outro problema apontado pelo presidente do Cofecon foi a fome. “Hoje 33 milhões de brasileiros passam fome e quase metade da população sente a situação de insegurança alimentar. É uma situação que nos deve indignar a todos, e particularmente nós economistas”, argumentou Lacerda. “Nós economistas temos as soluções técnicas, mas as decisões ocorrem no âmbito político. Daí a importância das eleições gerais que ocorrem daqui a dois meses. Precisamos reverter esta situação. As eleições são uma oportunidade para que escolhamos pessoas comprometidas, tanto no Executivo quanto no Legislativo. Só a partir do enfrentamento dos nossos problemas – algo possível, porque o Brasil é um país de enorme potencial – é que poderemos atingir o desenvolvimento”, finalizou.